segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Poema 70

Ela ia mordendo a maçã

Devagar

Chupando os pingos

Sem conseguir evitá-los

E com os dentes

Ia dando o contorno

Que queria

Fazia a cabeça

Os braços desiguais

As pernas tortas

Tudo com

Seus dentes

As marcas de seus dentes

Enquanto fazia os braços

A cabeça começava a mudar

De cor

Quando chegava as pernas

Os braços mudavam

De cor

E ela voltava sua boca

De novo para a cabeça

Diminuindo

Os braços

Também

E as pernas

Depois

Aos poucos o boneco ia sumindo

Dentro dela

Aos poucos ela o descobria de novo

E ele exposto

Amadurecia e apodrecia

Rápido demais

Na pele

Ela ia cravando seus dentes

Até que ele simplesmente sumiu

Não havia nada dentro dele

Tudo estava

Dentro

Dela

Cada vez mais

Ele

Some.

(Poema 70; in Tudo Isso Que Eu Não Consigo Dizer Embalado Pra Viagem)