E você me doía no peito
como um tablete efervecendo
num copo de requeijão
cheio de água
como uma ressaca vira-lata
você vem furando com seus dentes
os restos no meio da rua
vazando o real
acabando de cantarolar a música
com o cubo de gelo na boca
com o copo na mão
arranhando o sol que entra pela porta
com essas pernas
e me olha tão sozinha
como coisa nenhuma que se pode dizer agora
e sempre um sexo melhor que um sentido
e uma noite só a mesma que a outra
festejando com as feridas quando você
parece só um entulho de uma ausência
que está sempre desviando os olhos
para dentro pronta para enfiar as mãos na solidão
e me dar os restos na boca, com anestésicos, whisky,
e mais âncoras das quais só sabemos tomar todo cuidado
tão vago estar tão bêbado pensando que estou emigrando
de um desperdício controlado pra uma grande coisa nenhuma
que é fatal sentir uma hora ou outra pensando em tocar suas coxas
e eu acabarei chorando tanto que em todas as direções será para fora
e o quanto puder para longe, sem fim, sem as palavras formando
seu corredor polonês nas minhas entranhas, sacudindo a mesma
falta de tudo que não está comigo, uma lista inesgotável amputando
de mim alguma coisa que eu fosse quando não havia nada em troca
de você montada em mim me espremendo o fôlego e olhando
direto nos meus olhos, sacudindo meu rosto, levando o meu primeiro olhar do dia,
se misturando como algo que não enfraquece dentro da minha garganta
em silêncio como uma estória limpa, sem rasuras, se afastando devagarinho
a cada manhã, cantando cada vez mais baixinho, até que a dor disfarçasse
o que é necessário para que você permaneça inalterável e faminta,
separada de mim pelo ar puro do que já havia visto antes.